Catalunha vai continuar dividida ao meio após as eleições de hoje

Apesar do crescimento das forças não independentistas augurado pelas sondagens, os partidos separatistas continuam a contar com apoios sólidos entre a população.

Hoje vive-se uma jornada excecional para a Catalunha e, de forma colateral, para toda Espanha. Realizam-se umas eleições regionais numa comunidade autónoma que foi protagonista da vida nacional durante os últimos meses devido ao desafio institucional dos seus governantes às normas legais espanholas, em busca da transformação num Estado independente.

Interrompido por força da lei esse caminho unilateral, mais de 5,5 milhões de catalães são chamados a dirimir nas urnas se esse processo de secessão ficará congelado durante uns lustros, pelo menos até a lei mudar a esse respeito, ou se permanece vivo em virtude de resultados eleitorais que indiquem apoio amplo e continuado aos grupos políticos que concorrem sob o amparo das bandeiras independentistas.

Peritos em estudos de opinião e politólogos auguram uma repetição da situação prévia ao ato eleitoral: uma sociedade dividida praticamente ao meio, em dois blocos antagónicos (independentistas e constitucionalistas), cada vez mais irreconciliáveis, e o risco certo de nenhuma dessas fações ter força parlamentar e apoios políticos suficientes para formar o próximo governo regional. O horizonte de repetição das eleições, lá para junho do próximo ano, não se pode descartar por completo. À hora a que este texto é enviado de Barcelona, a jornada eleitoral decorre com normalidade: prevê-se uma participação alta, acima dos 75 ou 80% do eleitorado. A maior parte dos votantes exercerá o seu direito a partir das seis da tarde (cinco em Portugal), por ser um dia de trabalho. Três horas depois (20h em Espanha, 19h em Portugal continental)) encerram as assembleias de voto.

É fácil explicar as circunstâncias que dotam de excecionalidade esta ida às urnas de dezembro, dia do começo oficial do inverno meteorológico e véspera do sorteio da Lotaria Nacional, uma das ocasiões mais emblemáticas do calendário espanhol. As eleições foram convocadas pelo primeiro-ministro de Espanha, Mariano Rajoy, e não pelo chefe do governo regional, como é costume, ao abrigo da lei que rege a atividade política e administrativa dos 17 territórios autónomos espanhóis.

Rajoy agiu empregando as competências que lhe foram outorgadas por aplicação do artigo 155 da Constituição espanhola – outro facto excecional –, em reação à Declaração Unilateral de Independência (DUI) pelo parlamento da Catalunha, considerada contrária ao direito. As regionais celebram-se em dia útil, coisa que não sucedia em Espanha há mais de 20 anos. Pelo menos 16 dos candidatos apresentados pelos partidos separatistas, e que têm possibilidades de ser eleitos deputados, estão envolvidos, com graus variáveis de responsabilidade, em processos judiciais.

O antigo vice-presidente do governo catalão, Oriol Junqueras, está na prisão com outros antigos membros desse executivo, que o artigo 155 destituiu, e com dirigentes de associações cívicas independentistas. O ex-presidente Carles Puigdemont fugiu para a Bélgica, acompanhado de vários companheiros de governo. Arrisca detenção e encarceramento imediatos se pisar solo espanhol.

O despertar de parte substancial da sociedade catalã, claramente oposta às tentações soberanistas e que pouco participava em eleições regionais, augura uma taxa de participação histórica, que poderá mesmo chegar aos 80%. Os resultados estão nas mãos de um milhão de eleitores, sobretudo jovens, indecisos ainda esta manhã sobre o sentido do seu sufrágio. Votarão pela primeira vez 143 mil cidadãos que acabam de atingir a maioridade.

É também a primeira vez que um partido não nacionalista, o Cidadãos (centro-direita liberal), tem possibilidades sérias de ser o mais votado. A sua candidata a presidente da Catalunha é Inés Arrimadas. Ela e Miquel Iceta, candidato do Partido dos Socialistas da Catalunha (ramo regional do PSOE) têm a chave da alternativa, podendo formar um Executivo não independentista na Catalunha. Do mesmo lado unionista, o Partido Popular (direita, no poder em Espanha) deve ser castigado pela associação dos seus dirigentes catalães a Rajoy.

A fação separatista é representada pela Esquerda Republicana da Catalunha (do preso Junqueras), pela lista Juntos pela Catalunha (de tendência liberal-conservadora, encabeçada pelo auto exilado Puigdemont) e pela Candidatura de Unidade Popular (extrema-esquerda antissistema). A meio dos dois blocos, e talvez crucial para resolver o impasse, fica a lista Em Comum Podemos (esquerda populista), que é contra a secessão mas a favor de um referendo pactuado.

Source: Expresso

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